A infância é um tempo de descobertas, brincadeiras e construção da identidade. No entanto, em um cenário cada vez mais digital, vemos crianças e adolescentes expostos a pressões típicas da vida adulta. Esse fenômeno, chamado de adultização infantil, ocorre quando etapas fundamentais do desenvolvimento são antecipadas de forma artificial, principalmente pelas redes sociais.
A questão ganhou destaque recente após o influenciador Felca denunciar a sexualização precoce de crianças em plataformas digitais, provocando debate nacional e até discussões no Congresso. Mas por que isso é tão grave?
A psicologia aponta que a adultização rouba experiências essenciais do crescimento saudável. Como dizia Donald Winnicott, a criança precisa de um espaço transicional seguro, onde o brincar é a linguagem principal. Quando esse espaço é substituído por likes, comentários e exposição da intimidade, o desenvolvimento emocional pode ser seriamente comprometido.
Mais do que um tema de internet, estamos falando de saúde mental, ética e responsabilidade social. É sobre preservar a infância como base da vida adulta — não como um ensaio apressado para ela.
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O que é adultização e por que precisamos falar sobre isso
Adultização é o processo pelo qual crianças e adolescentes são levados a assumir comportamentos, responsabilidades e papéis sociais típicos da vida adulta, antes do tempo adequado. Isso pode se manifestar em roupas, linguagem, atitudes e, mais recentemente, na forma como produzem conteúdo para redes sociais.
Jean Piaget, referência nos estudos sobre desenvolvimento infantil, explica que cada fase da infância corresponde a uma etapa cognitiva e emocional que não pode ser simplesmente “pulada”. A aceleração artificial pode gerar lacunas difíceis de reparar.
Falar sobre adultização é urgente porque não se trata apenas de uma questão cultural, mas de saúde mental e de direitos da criança. Como destacou a filósofa Hannah Arendt, a criança tem o direito de ser introduzida ao mundo de forma gradual, sem ser lançada de imediato às pressões adultas.
Quando normalizamos que crianças ajam como adultos, banalizamos riscos como a perda da espontaneidade, a exposição a predadores virtuais e a dificuldade de construir uma identidade sólida. Por isso, a discussão precisa envolver pais, educadores, psicólogos e também políticas públicas.
Como a exposição precoce nas redes sociais afeta a infância
As redes sociais se tornaram palco da vida moderna, mas para as crianças podem ser um território de armadilhas emocionais. A exposição precoce em plataformas digitais pode gerar um ciclo de comparação constante, onde curtidas e visualizações se tornam o novo “termômetro” da autoestima.
O psicólogo Erik Erikson, ao falar sobre as fases do desenvolvimento, destacou a importância de cada etapa ser vivida com segurança. A infância deve consolidar confiança e identidade, não ansiedade em busca de aprovação.
Ao exibir uma criança em situações adultizadas — com roupas, falas ou poses sensuais —, a sociedade a coloca em uma vitrine que não respeita sua maturidade emocional. Além do risco da sexualização precoce, há impactos como baixa autoestima, insegurança e até depressão infantil.
A filósofa Byung-Chul Han fala sobre a sociedade da performance, onde todos são avaliados por métricas externas. Quando essa lógica atinge a infância, os efeitos podem ser devastadores, pois a criança perde a chance de experimentar o erro, o tédio e o brincar sem julgamentos.
Portanto, refletir sobre a exposição digital é também repensar a forma como protegemos a infância em um mundo hiperconectado.
O impacto emocional: autoestima, ansiedade e depressão em crianças e adolescentes
A adultização não é apenas um detalhe estético ou cultural. Seus efeitos emocionais podem marcar para sempre a vida de uma criança. Estudos clínicos mostram que crianças expostas a julgamentos e críticas em redes sociais apresentam maior risco de desenvolver transtornos de ansiedade, depressão e baixa autoestima.
Segundo Carl Rogers, psicólogo humanista, o ser humano precisa de um ambiente de aceitação incondicional para florescer. Quando a criança é constantemente medida por padrões externos, como a aparência ou a quantidade de curtidas, ela passa a condicionar seu valor ao olhar do outro.
Esse processo afeta diretamente a formação da identidade. Erikson descreve a adolescência como a fase da busca por quem se é; ao antecipar essa busca com padrões inalcançáveis de perfeição, geramos uma geração mais frágil, ansiosa e insegura.
Além disso, a superexposição online deixa rastros digitais que podem ser lembrados por anos, gerando vergonha e sofrimento. A infância não é um “ensaio geral” para a vida adulta: ela é a fundação emocional da vida futura. E quando fragilizada, compromete o que virá.
Quando a busca por aprovação se transforma em risco
Postar vídeos, fotos e compartilhar a vida pode parecer divertido e até inofensivo. Mas quando a motivação central é a busca por aprovação externa, os riscos psicológicos aumentam. A criança que aprende a depender de curtidas e comentários positivos pode desenvolver uma relação de dependência emocional com a validação alheia.
A filósofa Simone de Beauvoir já dizia que a sociedade impõe papéis antes mesmo da escolha individual. No caso das crianças, esses papéis surgem como uma pressão para parecer mais “bonita”, “adulta” ou “aceita”. Isso compromete a autenticidade e reforça padrões irreais.
Psicólogos também alertam que esse comportamento pode abrir portas para contatos perigosos com pessoas mal-intencionadas, já que a exposição precoce muitas vezes ultrapassa os limites da proteção.
A busca por aprovação deveria vir do espaço familiar, com pais e responsáveis oferecendo acolhimento, escuta e valorização. Quando isso é substituído por uma plateia virtual, a criança se fragiliza e corre riscos que ainda não tem maturidade para enfrentar.
A linha tênue entre criatividade infantil e exploração da imagem
Não podemos ignorar que muitas crianças têm talento para dançar, cantar ou se comunicar, e as redes sociais podem ser um espaço legítimo de expressão criativa. O problema surge quando essa expressão se transforma em exploração da imagem, sem limites adequados.
O filósofo Walter Benjamin dizia que cada infância carrega um modo único de ver o mundo. Proteger essa visão é fundamental para preservar a espontaneidade da criança. Quando ela é moldada para agradar o público adulto, sua criatividade é reduzida a performance.
O desafio é distinguir quando a produção de conteúdo é uma brincadeira saudável ou quando se torna uma vitrine prejudicial. A diferença está no grau de exposição, na intenção dos adultos responsáveis e na preservação do direito da criança de ser criança.
O alerta da psicologia é claro: incentivar a expressão é saudável, mas transformá-la em espetáculo constante, com traços de sensualização ou pressão estética, é violar o tempo natural do desenvolvimento.

O papel dos pais no acompanhamento da vida digital dos filhos
Nenhum filtro ou algoritmo é tão eficaz quanto a presença de pais atentos. A adultização infantil nas redes sociais só pode ser combatida de forma consistente quando a família assume o papel de guia e referência emocional. Isso significa acompanhar a rotina digital, conhecer as plataformas usadas e, principalmente, abrir canais de diálogo franco.
O psicanalista Donald Winnicott afirmava que a criança precisa de um “ambiente suficientemente bom”, onde os adultos ofereçam proteção e limites sem sufocar a criatividade. No universo digital, esse “ambiente” se traduz em monitorar conteúdos, conversar sobre riscos e estabelecer regras claras.
Mais do que vigiar, o papel dos pais é fortalecer a autoestima dos filhos para que não dependam da aprovação externa. Como ensinava Paulo Freire, a educação libertadora nasce do diálogo. Ouvir a criança, compreender suas motivações e ensiná-la a se valorizar são passos fundamentais para reduzir a vulnerabilidade frente à pressão das redes.
Assim, proteger a infância não significa isolar a criança da tecnologia, mas permitir que ela explore esse universo com segurança, sempre acompanhada de referências sólidas e afetivas em casa.
Influência digital e responsabilidade: o caso Felca e a denúncia que virou debate nacional
Quando o influenciador Felca publicou um vídeo denunciando a sexualização de crianças nas redes sociais, o assunto ganhou repercussão nacional. O impacto foi tão grande que o tema ultrapassou a internet e chegou à Câmara dos Deputados, onde já se discute a criação de leis de proteção digital para menores.
Esse episódio mostra como a sociedade digital tornou-se palco de disputas éticas e culturais. A filósofa Hannah Arendt alertava que a criança não deve ser lançada prematuramente ao “mundo público”, pois precisa antes de um tempo protegido de formação. A denúncia de Felca expôs justamente isso: crianças transformadas em espetáculo para consumo adulto, sem preparo nem consciência dos riscos.
O caso também revelou a força da influência digital no debate público. Se por um lado os influenciadores podem expor problemas e mobilizar mudanças, por outro, carregam a responsabilidade de educar pelo exemplo e denunciar práticas nocivas.
Para a psicologia clínica e jurídica, o episódio serve de alerta: quando a sociedade normaliza a adultização, legitima práticas que deixam marcas emocionais graves. Por isso, falar do caso Felca é também reforçar a urgência de proteger a infância como patrimônio coletivo.
O que a psicologia clínica e jurídica diz sobre a proteção da infância
A psicologia vê a infância como uma fase única, em que cada etapa deve ser respeitada. A psicologia clínica, na linha da Análise Clínica do Comportamento, enfatiza a importância de vivências seguras e espontâneas, onde a criança possa brincar, errar e experimentar sem pressões externas.
Já a psicologia jurídica entende que a proteção da infância também é uma questão de direitos. Segundo a Lei da Alienação Parental (Lei nº 12.318/2010), a integridade emocional da criança deve ser preservada em qualquer contexto, inclusive no digital.
O psicólogo Erik Erikson destacou que a identidade se forma a partir de crises vividas em cada estágio. Se essas crises são aceleradas pela adultização, o risco é gerar adolescentes inseguros, ansiosos e com baixa autoestima. Da mesma forma, Winnicott lembrava que a ausência de proteção pode deixar “lacunas” no desenvolvimento, que mais tarde surgem como sintomas emocionais graves.
Portanto, para a psicologia clínica e jurídica, o combate à adultização não é apenas uma questão de cuidado individual, mas de responsabilidade coletiva e legal. Cuidar da infância é cuidar do futuro.
O avanço do debate: Câmara dos Deputados discute leis e medidas de proteção online
A repercussão do caso Felca acelerou um debate que já vinha crescendo: a criação de leis que protejam crianças nas redes sociais. Hoje, a Câmara dos Deputados discute projetos que preveem limitar a exposição infantil, coibir conteúdos sexualizados e responsabilizar plataformas digitais pela proteção de menores.
Esse movimento reflete a necessidade de transformar a preocupação social em política pública. Como destacou o filósofo Jürgen Habermas, a esfera pública só se fortalece quando os direitos dos mais vulneráveis são garantidos pelo coletivo.
Do ponto de vista psicológico, essa regulamentação é urgente. Pesquisas apontam que a exposição precoce aumenta o risco de transtornos de ansiedade e depressão infantil. No campo jurídico, leis específicas podem oferecer ferramentas mais sólidas para punir abusos e proteger famílias que enfrentam situações de exploração.
O debate na Câmara, portanto, não é apenas sobre tecnologia, mas sobre o direito fundamental da criança a viver a infância em segurança. Essa é uma pauta que une psicologia, sociedade e justiça em torno de um objetivo comum: preservar o bem-estar das novas gerações.
Caminhos práticos para proteger crianças e adolescentes nas redes sociais
Além das discussões políticas, a proteção da infância nas redes começa em atitudes do dia a dia. Algumas medidas simples podem reduzir os riscos:
- Supervisão ativa: acompanhar o uso das redes e conhecer os conteúdos acessados.
- Educação digital: ensinar crianças a diferenciar o que é seguro do que é perigoso.
- Fortalecimento da autoestima: valorizar conquistas reais e não apenas aparências online.
- Limites de tempo: estabelecer horários para uso das telas, incentivando brincadeiras fora do digital.
A psicologia recomenda também a criação de espaços de diálogo, onde a criança possa compartilhar dúvidas e experiências sem medo de julgamento. Como dizia Vygotsky, o aprendizado se dá nas interações. O mesmo vale para a educação digital: é conversando, não proibindo, que se constrói consciência.
Já do ponto de vista jurídico, é essencial conhecer canais de denúncia como o Disque 100, que acolhe casos de violações de direitos de crianças e adolescentes.
Proteger a infância nas redes é uma tarefa conjunta entre pais, sociedade, influenciadores e poder público. Afinal, infância não é um ensaio da vida adulta. É o alicerce que sustenta o futuro.
Perguntas Frequentes (FAQ) sobre Adultização Infantil nas Redes Sociais
1. O que significa adultização infantil?
Adultização é quando crianças ou adolescentes passam a assumir comportamentos e papéis de adultos antes do tempo adequado, como roupas, falas e atitudes sexualizadas, especialmente em redes sociais.
2. Quais os riscos da adultização nas redes sociais?
Entre os principais riscos estão baixa autoestima, ansiedade, depressão, exposição à sexualização precoce e maior vulnerabilidade a predadores virtuais.
3. O caso Felca tem relação com a adultização?
Sim. A denúncia feita pelo influenciador Felca trouxe à tona práticas de sexualização precoce de crianças na internet e impulsionou um debate nacional sobre proteção da infância.
4. O que a psicologia clínica e jurídica diz sobre isso?
A psicologia clínica defende que cada fase da infância deve ser respeitada para um desenvolvimento saudável. Já a psicologia jurídica alerta que a proteção da criança também é uma questão de direitos e pode envolver medidas legais.
5. Como os pais podem proteger seus filhos nas redes sociais?
Os pais podem acompanhar a vida digital, estabelecer limites de tempo, fortalecer a autoestima dos filhos e conversar abertamente sobre riscos. Em casos graves, recomenda-se buscar ajuda psicológica e acionar canais de denúncia como o Disque 100.
Proteja a infância com apoio psicológico especializado
A adultização de crianças e adolescentes não é apenas um desafio digital: é um problema emocional, familiar e social que pode deixar marcas profundas. Se você percebe sinais de ansiedade, baixa autoestima ou dificuldades de identidade em seus filhos, buscar ajuda profissional pode fazer toda a diferença.
A Psicóloga Daniele Pereira e Silva, especialista em Psicologia Clínica e Jurídica em Goiânia, oferece um espaço de escuta acolhedora e técnica para famílias que enfrentam os impactos da exposição digital e da adultização precoce.
Com uma abordagem fundamentada na Análise Clínica do Comportamento, Daniele ajuda pais e filhos a reconstruírem vínculos, fortalecerem a autoestima e encontrarem estratégias para viver a infância e a adolescência de forma saudável e protegida.
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Entre em contato pelo WhatsApp ou redes sociais e agende sua consulta. Proteger a infância é um investimento no futuro.

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Referências:
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